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O Básico para Entender a Dieta "Alcalina"


Regiões do corpo tem diferente pH, com diferentes propósitos.

É de fato vital que nosso sangue se mantenha levemente alcalino, assim como grande parte do meio extra-celular - e nesse ponto talvez a dieta possa ter um impacto, mas certamente o modo como é difundida a proposta de uma dieta alcalina e a grande parte dos argumentos utilizados é incoerente e não condiz com a ciência.

Há muita desinformação sendo propagada no campo da alimentação e saúde, tanto pelos meios "oficiais" quanto pelos meios "alternativos".

Portanto, aqueles que desejam realmente entender determinados tópicos precisam se esforçar um pouquinho, deixar de lado ideologias e investigar consistentemente até alcançar elementos sólidos.

Traduzi este artigo de viés mais científico sobre a "dieta alcalina" com o propósito de esclarecer em nível bem básico, com uma certa acidez lúcida, este conceito que vem sendo tão causticamente abusado.

O Mito Da Dieta Alcalina: Uma Avaliação Baseada Em Fatos

Escrito pelo nutricionista Joe Leech, MS Traduzido por Pedro Ivo

Defensores desta dieta sugerem que substituir alimentos criadores de acidez por alimentos alcalinos melhora a saúde.

Até mesmo afirmam que pode ajudar no combate de doenças sérias como o câncer. Muitos juram que experimentaram resultados milagrosos com ela...

Mas existem evidências sólidas por trás dessas alegações? Vejamos...

O que é a Dieta Alcalina?

A dieta alcalina também é conhecida como dieta ácido-alcalina ou dieta da cinza alcalina.

Está baseada na ideia de que os alimentos que você ingere alteram a acidez ou a alcalinidade (o valor do pH) do seu corpo.

Deixe-me explicar como funciona...

Quando você metaboliza a comida e extrai sua energia (calorias), na verdade você está queimando os alimentos, só que de maneira gradual e controlada. Quando você queima comida, sobram cinzas como resíduo, assim como a madeira quando é queimada numa fogueira.

A cinza que resta pode ser ácida, alcalina ou neutra... e os adeptos dessa dieta defendem que esta cinza afeta diretamente a acidez do seu corpo. Portanto se você ingere alimentos que geram cinza ácidas, eles tornarão seu corpo ácido; alimentos que geram cinza alcalina, deixarão seu corpo alcalino. Cinzas neutras tem efeito neutro. Simples.

Cinzas ácidas deixariam você mais vulnerável à doenças e problemas de saúde, enquanto que as cinzas alcalinas teriam um efeito protetor. Ao escolher mais alimentos alcalinos, você seria capaz de “alcalinizar” sua dieta e melhorara sua saúde.

Componentes alimentares que produzem cinzas ácidas incluem proteínas, fosfatos, enxofre, enquanto que dentre os componentes alcalinos estão o cálcio, magnésio e potássio (1,2).

Certos grupos alimentares são considerados ácidos, outros alcalinos e outros neutros:

Ácidos: carne vermelha, carne de porco, peixes, laticínios, ovos, grãos e álcool

Neutros: gorduras naturais, amidos e açúcares.

Alcalinos: frutas, nozes, legumes e vegetais

Conclusão: De acordo com os defensores da dieta alcalina, as cinzas geradas pela combustão dos alimentos podem afetar diretamente a acidez ou alcalinidade do corpo.

Níveis Regulares de pH no Corpo

Ao falar de dieta alcalina, é importante entender o que significa o valor de pH.

De modo bem simples, o pH é a medida de o quão ácido ou alcalino algo é.

Os valores de pH variam de 0 a 14:

  • 0-7 é ácido

  • 7 é neutro

  • 7-14 é alcalino (também chamado de básico).

Muitos proponentes dessa dieta sugerem que as pessoas monitorem o valor de ph da urina usando fitas de teste para ter certeza que é alcalina (ph maior do que 7) e não ácida (menor que 7).

No entanto, é importante notar que o ph varia grandemente no interior do corpo. Algumas partes são ácidas, outras alcalinas. Não há um nível constante.

O estômago está cheio de ácido clorídrico, que tem o valor de ph entre 2 e 3,5 (altamente ácido). Isto é necessário para a digestão dos alimentos. Por outro lado, o sangue humano é sempre levemente alcalino, com um ph entre 7,35 e 7,45.

Uma mudança no nível normal do ph sanguíneo, mesmo que pequena é muito séria e pode ser fatal se não for tratada rapidamente. Mas esses casos ocorrem apenas durante desequilíbrios relacionados a doenças e não tem absolutamente nenhuma relação com os alimentos ingeridos no dia-dia.

Conclusão: O valor de ph é a medida de quão ácido ou alcalino algo é. O estômago é altamente ácido, já o sangue é levemente alcalino, com um ph que varia entre 7,35 e 7,45.

A Comida Afeta o pH da Urina, mas não o do Seu Sangue

O valor constante do pH sanguíneo é um fator crítico para a saúde.

Se ele sair da faixa normal, suas células parariam de funcionar e se não forem rapidamente tratadas, morreriam rapidamente. Por esta razão, o corpo desenvolveu mecanismos muito efetivos para regular de modo muito preciso o valor de pH do corpo. Esse mecanismo é conhecido como Homeostase Ácido-Base.

Felizmente, esses mecanismos fazem com que a alteração do pH sanguíneo por influências externas seja quase impossível, se assim não fosse, certamente teríamos problemas.

O fato é: os alimentos não alteram o pH do sangue. Ponto.

No entanto, a comida pode modificar o valor de pH da urina, ainda que os resultados não sejam sempre confiáveis (3,4) .

Na verdade, essa é uma das principais maneiras do seu corpo regular o pH sanguíneo... excretar ácidos através da urina.

Se você come um grande pedaço de bife, algumas horas depois sua urina estará mais ácida, pois o corpo estará eliminando os resíduos do sistema.

Dito isso, a urina é na verdade um fraco indicador do pH do corpo e da saúde em geral. E pode ser influenciada por muitos outros fatores além da dieta.

Portanto se você estiver usando tiras de teste para medir o pH e sua urina estiver alcalina, esse fato terá pouca (se tiver alguma) relevância para a alcalinidade do seu sangue ou de sua saúde em geral.

Conclusão: O corpo regula minuciosamente os níveis de pH do sangue e não é possível afetá-lo através da dieta, mas a dieta pode afetar o valor de pH da urina.

Alimentos formadores de acidez não causam osteoporose

Osteoporose é uma doença degenerativa caracterizada pela perda progressiva do conteúdo mineral dos ossos.

A Osteoporose é particularmente comum entre as mulheres na fase pós-menopausa e aumenta drasticamente o risco de fraturas ósseas.

Muitos entusiastas da dieta alcalina acreditam que para manter o pH sanguíneo constante, o corpo utiliza minerais alcalinos (como o cálcio) dos ossos para se proteger da acidez criada pelos alimentos ácidos que foram consumidos.

De acordo com essa teoria, dietas formadoras de acidez - como a dieta ocidental padrão - causam perda mineral e diminuição da densidade óssea. Essa teoria é conhecida como a “hipótese da osteoporose da cinza ácida.”

Uma falha gritante dessa teoria é que a função dos rins é completamente ignorada. Os rins têm papel fundamental em remover resíduos ácidos e regular o pH do corpo. É uma de suas principais funções.

Os rins produzem íons de bicarbonato que neutralizam ácidos presentes no sangue, um processo constante que permite que o corpo regule de modo preciso o pH sanguíneo (5).

Nosso sistema respiratório também está envolvido no controle do pH sanguíneo. Quando os íons de bicarbonato dos rins se ligam aos ácidos do sangue, eles formam o dióxido de carbono (que nos expiramos) e água (que urinamos).

Os ossos não estão envolvidos neste processo de modo algum.

Outro problema com a hipótese das cinzas ácidas é que ignora um dos principais motivos causadores da osteoporose, a diminuição da proteína colágeno dos ossos (6,7).

Ironicamente, essa perda de colágeno está fortemente ligada com os baixos níveis de ácido ortosilícico e ácido ascórbico (vitamina C) na dieta (8). Analisando as pesquisas, não encontramos nenhum estudo que demonstre uma relação entre a acidez na dieta e densidade óssea ou risco de fraturas. De fato, não nem mesmo relação entre o pH da urina e saúde óssea (9,10,11).

Contrariamente à crença popular, dietas de alto teor proteico (formadoras de acidez) estão relacionadas com ossos mais saudáveis (12,13,14).

Esta área de pesquisa não é conclusiva, mas realmente sugere que proteína animal, o alimento mais causador de acidez de todos, é na verdade benéfico para a saúde dos ossos.

Através de um grande número de avaliações de testes clínicos (ciência de verdade), pode-se concluir que dietas formadoras de acidez não tem impacto algum nos níveis de cálcio do corpo (15,16,17).

De fato, oposto pode ser verdadeiro, pode ocorrer melhora da saúde óssea através de um aumento na retenção de cálcio e da ativação do hormônio IGF-1, que estimula o reparo de músculos e ossos (18,19).

Isso reforça os estudos que conectam grande ingestão de proteína (que são formadoras de acidez) com uma melhor saúde dos ossos, e NÃO pior.

Conclusão: Pesquisas não apoiam a ideia de que dietas formadoras de acidez sejam prejudiciais à saúde óssea. Proteína, um nutriente ácido, parece ser benéfico.

E a relação entre o câncer e a acidez?

O mais extenso e detalhado estudo disponível sobre a relação entre acidose induzida por dieta e câncer concluiu que não há ligação direta (20).

Mesmo com essa evidência, muitos ainda alegam que o câncer cresce apenas num ambiente ácido e pode ser tratado e até mesmo curado com uma dieta alcalina.

Mas essa ideia é inconsistente por diversas razões.

A primeira e mais importante, como foi mencionado anteriormente – os alimentos não influenciam o pH do sangue (4, 21).

Segunda, mesmo que a alimentação pudesse alterar dramaticamente o valor de pH do sangue ou de outros tecidos, as células cancerosas não se restringem à ambientes ácidos.

De fato, o câncer cresce em tecidos normais do corpo que tem pH levemente alcalino de 7,4. Muitos experimentos confirmaram isso ao reproduzir e crescer células cancerosas num ambiente alcalino (22).

Ainda que tumores cresçam mais rapidamente em ambientes ácidos, são os próprios tumores que criam a acidez. Não é o ambiente ácido que cria o câncer, mas sim o câncer que cria o ambiente ácido (23).

Conclusão: Pesquisas atuais demonstram que não absolutamente nenhuma ligação entre uma dieta geradora de acidez e o câncer. Células cancerosas também crescem em ambientes alcalinos.

Podemos aprender algo com as dietas ancestrais?

Olhar para a teoria ácido-alcalina de uma perspectiva evolucionária e científica revela bastante coisa.

Um estudo estimou que 87% dos humanos anteriores à agricultura consumiam dietas alcalinas (24).

Esse estudo foi uma das bases para muitos argumentos apoiando a dieta alcalina.

No entanto, os estudos de Weston A. Price sobre os povos Masai e Inuit estão entre as primeiras pistas científicas que uma dieta ácida não tem impactos nocivos sobre o estado geral de saúde.

Esses povos indígenas mantinham excelente saúde, mesmo com dietas baseadas fortemente em carnes e alimentos derivados de animais.

Pesquisas mais recentes estimam que por volta de metade da população pré-agricultural consumia dietas ácidas e outra metade consumia dietas alcalinas (25).

Isso parece mais realista, visto que nossos ancestrais viviam em climas muito diferentes com acesso a diferentes tipos de alimentos. De fato, dietas mais formadoras de acidez eram mais comuns na medida em que os povos iam se afastando ao norte da linha do equador, para longe dos trópicos (26).

Então, apesar de por volta da metade dos caçadores coletores estarem se alimentando de uma dieta formadora de acidez, as doenças da civilização moderna eram praticamente inexistentes (27).

Mensagem Final

Diferentemente de muitas dietas estranhas, a dieta alcalina pode até ser bem saudável .

Encoraja um alto consumo de frutas, legumes e vegetais, enquanto restringe os alimentos processados e junk foods.

No entanto, as alegações que estão por trás da dieta NÃO são apoiadas por nenhuma evidência evolucionária, nem pela fisiologia humana ou qualquer estudo confiável em seres humanos.

Ácidos são na verdade um dos constituintes essenciais da vida... incluindo aminoácidos, ácidos graxos e o seu DNA (ácido desoxirribonucleico).

A dieta alcalina pode ser saudável por ser baseada em alimentos de verdade e não processados. Não tem absolutamente nada a ver com ser ácida ou alcalina. Ponto.

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